Um dia, o BCP definiu a sua linha da vida em dez mil milhões de euros. Mas agora a linha é outra: 7%. Quem quer comprar um banco? E quem comprar-lhe créditos?
Longe vão os tempos do capital à disposição das loucuras. Quando Paulo Teixeira Pinto, há quatro anos, justificou a OPA (hostil) que lançou sobre o BPI, disse-o: se o BCP valer menos que dez mil milhões será um alvo em movimento. Nessa ânsia de crescer, o BCP tentara comprar um banco na Roménia e tentava agora o BPI. Falhou ambas as aquisições. Felizmente: se tivesse ganho qualquer delas, àqueles preços, o BCP estaria hoje falido.
Dez mil milhões de euros é hoje uma miragem para o BCP. E este é um dos bancos mais pressionados com as regras aprovadas ontem por banqueiros centrais e reguladores do sistema financeiro de todo o mundo, quando confirmaram um rácio mínimo de capital de 7%. Há tempo, muito tempo, para resolver os problemas. Mas não é por isso que deixam de sê-lo: problemas. Para o BCP e para todos os outros.
Não é uma ironia mas é o destino. Um destino que os próprios bancos traçaram e não apenas por loucuras estrangeiras da inovação financeira. Também em Portugal se cometeram erros imperdoáveis na gestão de créditos com base no mesmo falacioso argumento: se toda a gente está a fazê-lo, por que não o fariam eles?
E fizeram-no. Deram crédito demasiado barato. E comprometeram uma grande parte dos seus balanços em empréstimos para comprar casa por "spreads" abaixo de 1%, abaixo de 0,5%, abaixo de 0,2%!, aprisionando-se em contratos de 30 ou 40 anos. É por isso que agora aproveitam qualquer nesga para subir "spreads". É por isso que em novos contratos há bancos que estão a testar cláusulas de revisão unilateral.
Durante muito tempo, os bancos fizeram pressão para que as novas regras de capital, solvabilidade e liquidez, consagradas em "Basileia III", não avançassem, com o argumento de que iriam agravar o problema: se ninguém está a investir em banca, como conseguir aumentos de capital? Do lado da regulação, contudo, a noção era de que ou era agora ou nunca, sendo que a pressão política era de que fosse agora.
Esta é a altura em que a banca define a sua nova vida. Ontem mesmo, o maior banco da Alemanha anunciou um aumento de capital de (curiosamente) dez mil milhões de euros. Em Portugal, os bancos travam a concessão de novos créditos e nem sequer renovam todas as linhas concedidas a empresas, fazendo-o sempre por custos mais elevados. Assim será doravante: ser cliente bancário sairá mais caro. Estamos reféns dos empréstimos do Banco Central Europeu, que ainda aumentarão até um dos níveis mais elevados da Europa (já vai em um terço do PIB).
Corto Maltese, o herói de BD de Hugo Pratt, desenhou a sua própria linha da vida nas mãos, com uma navalha. Era o símbolo de que o destino pode ser traçado por nós mas que é preciso sangrar para consegui-lo. Se trocarmos o destino por um desatino, entregamos a nossa independência. Não foi a Alemanha que nos disse sim a vigiar o Orçamento, nós é que perdemos o poder de dizer não.
FMI escreve-se com as mesmas letras de FIM. Fim da linha para quem não tem coragem para governar. Não saberemos nós fazer nada além de aumentar impostos?
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